Diferente dos musicais aos modos da Broadway e atuais musicais brasileiros, que focam em cantores, Madame Satã é uma biografia musicalizada, que pensa a música como instrumento de debate e discurso da negritude. Apesar de ter um caráter biográfico, o musical não tem um compromisso de contar cronologicamente a vida da personagem Madame Satã.
“A dramaturgia da peça foi criada a partir das situações relatadas pelo próprio Madame. Não estamos nos baseando em factoides, mas em relatos e entrevistas que o Madame concedeu. Buscamos ouvir a voz dessa personagem mito carioca”, explica Daniel Arcades.
O ator Sulivã Bispo dará vida a Madame Satã, um sujeito negro, homossexual, com diversas passagens pela cadeia e taxado de malandro durante toda sua história e com tantas dissidências da normatividade, uma dramaturgia correspondente a esta história necessita de um pensamento aliado a marginalidade da cena à história contada e aos ritmos musicais presentes.
As composições criadas para o musical estão inscritas e escritas no ritmo do funk, da percussão, no samba do início do século XX (quando ainda era um ritmo criminoso), com a métrica de sambas populares. O objetivo principal da montagem é transitar pelo percurso de Madame Satã e promover uma reflexão sobre o poder de instrumentalização do corpo, tendo como horizonte a produção de subjetividades contemporâneas.
O espetáculo, que tem como base a poética do Teatro Documental e traz 13 atores em cena, não rompe totalmente com o caráter representativo de obras biográficas, na medida em que se baseia em uma “história real”. “Madame Satã desdobrar-se em incontáveis versões. Esta talvez seja a principal característica dele. Satã não foi. Satã é e está em constante devir”, descreve Romero.